Organizações brasileiras pedem proteção internacional a juízes e mesários nas eleições

Press release WBO 25 de agosto de 20222

  • Temor de ameaça e violência são levados à Comissão Interamericana 

  •  Órgão da OEA tem o poder de questionar o Brasil e ditar medidas protetivas

Um grupo de nove organizações da sociedade civil brasileira pediu nesta quarta-feira (24) à presidente da CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos), a peruana Julissa Mantilla, que tome medidas para garantir a proteção de juízes eleitorais, mesários e outros grupos expostos à violência política nas eleições presidenciais brasileiras de outubro deste ano.

Jullissa Mantilla, presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington

O pedido foi feito em reunião virtual com Mantilla e com o relator da CIDH que é responsável pela proteção de defensores de direitos humanos nas Américas, o mexicano Joel Herndández. Na reunião virtual, os representantes das organizações mostraram aos membros da Comissão a situação de risco que algumas categorias de pessoas envolvidas no processo eleitoral já vêm enfrentando no Brasil por conta de declarações hostis do presidente Jair Bolsonaro contra a Justiça Eleitoral e o sistema de votação no país.

“Nós temos a preocupação de que mesários possam sofrer algum tipo de violência, em zonas eleitorais, e nós não sabemos se as forças policiais e as Forças Armadas se colocarão ao lado da democracia ou ao lado do discurso de fraude, caso o presidente Bolsonaro perca a eleição”, disse aos membros da Comissão a constitucionalista Estefânia Barboza, do Demos – Observatório para Monitoramento dos Riscos Eleitorais no Brasil.

Barboza chamou a atenção ainda para “os ataques ao Poder Judiciário brasileiro, especificamente ao Supremo Tribunal Federal e, mais recentemente, contra a Justiça Eleitoral”. De acordo com ela, esses ataques constituem “uma tática dos novos líderes autoritários, que buscam fragilizar o Poder Judiciário”. No caso brasileiro, disse ela, “isso é feito por meio de campanhas massivas de desinformação, num processo bastante organizado para atacar diariamente os ministros e as instituições ao longo dos anos”.

Claudia Maria Dadico, da AJD (Associação dos Juízes pela Democracia), classificou a situação no período eleitoral brasileiro como “gravíssima” e manifestou preocupação “com a segurança física dos juízes que atuarão no âmbito eleitoral”, afirmando aos membros da Comissão Interamericana que “não há garantias em relação ao comportamento das forças de segurança porque muitos de seus membros estão cooptados pelo bolsonarismo” e pelas campanhas de desinformação e de ódio contra o Judiciário brasileiro.

“Este governo faz dos ataques ao Poder Judiciário uma forma de governança. Ele força situações de descumprimento [da lei] para que o controle do Judiciário se faça necessário e, quando o Poder Judiciário atua, ele passa a atacá-lo, como um bode expiatório, a fim de produzir seus discursos de violência e de incitação à ruptura institucional, direcionado a seus seguidores”, disse Dacico.

Apoio internacional ao Brasil

Os participantes da reunião também relataram represálias, ameaças e perseguições dirigidas a juízes que assinaram a carta em defesa da democracia lançada no dia 11 de agosto, no Largo São Franciso, em São Paulo 

"Nós, dentro de nossas organizações, não temos a capacidade de, sozinhos, fazer com que o Estado atue para impedir essas campanhas de desprestígio e de difusão de notícias falsas”, disse Ney Strozake, da ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia), remarcando que agora é preciso “apoio de organizações do âmbito internacional que se posicionem concretamente em defesa do sistema eleitoral brasileiro”.

Comissão Interamericana recebe grupo de 19 representantes de organizações da sociedade civil brasileira, em Washington, em 29 de julho. Foto": Maria Magdalena Arréllaga / WBO

Representantes das demais organizações também apresentaram informações e fizeram pedidos semelhantes, como os membros do WBO (Washington Brazil Office), LAUT (Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo), Terra de Direitos, Fórum Justiça, CBJP (Comissão Brasileira Justiça e Paz), Comissão Arns de Direitos Humanos, MJDH (Movimento de Justiça e Direitos Humanos), Anadep (Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos) e Instituto Novos Paradigmas. 

Ao fim da reunião, o grupo fez três pedidos: que a Comissão Interamericana faça uma declaração pública para que 7 de setembro não se transforme num ataque às instituições democráticas, ao STF e ao TSE; que faça também uma declaração no dia da eleição, 2 de outubro, chamando a eleições pacíficas e ao respeito aos direitos humanos e ao resultado do processo eleitoral; e a visita ao Brasil do relator Joel Hernández, para acompanhar as eleições in loco.

Os membros da Comissão Interamericana tomaram nota dos pedidos e disseram que o órgão segue atentamente a situação brasileira, tendo já criado uma “sala de situação” para o acompanhamento constante do contexto. Além disso, relembraram que a Comissão já publicou, no dia 29 de junho, um comunicado instando o Estado brasileiro a tomar as medidas necessárias para prevenir a violência associada ao processo eleitoral, e relembraram que a eleição brasileira será acompanhada por uma missão de observadores da OEA (Organização dos Estados Americanos).

A CIDH tem sede em Washington e é um órgão que faz parte do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, juntamente com a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ambas instâncias são independentes, mas agem dentro do sistema da OEA para promover e proteger os direitos humanos nas Américas.

A Comissão tem atribuição para questionar o Estado brasileiro, determinar a adoção de medidas cautelares e a adoção de ações concretas para resguardar direitos e categorias vulneráveis. Suas posições internacionais têm ainda o poder de influenciar as posições de outros países e de outros organismos internacionais que também acompanham o processo eleitoral brasileiro e seu desfecho.

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