Sanders pede que EUA rompam com o Brasil se Bolsonaro desrespeitar eleições

Press release WBO 12 de agosto de 2022

Senador americano Bernie Sanders recebe parte da comitiva de 19 representantes de organizações brasileiras que estiveram em Washington no fim de julho de 2022 para falar das ameaças à democracia e ao processo eleitoral. Crédito: Maria Magdalena Arréllaga/WBO

  • Senador americano apresenta moção em defesa da democracia brasileira e do respeito ao resultado das urnas, seja quem for o vencedor

  • Iniciativa foi anunciada dias depois de visita de uma comitiva da sociedade civil a Washington, organizada pelo WBO

Bernie Sanders, senador democrata pelo estado de Vermont, anunciou nesta quinta-feira (11) que apresentará uma moção no Senado dos EUA em defesa da democracia e do respeito ao processo eleitoral brasileiro, assim que os parlamentares voltarem do recesso, ainda em agosto. A iniciativa é resultado do encontro que Sanders manteve com 19 representantes de organizações da sociedade civil brasileira no dia 26 de julho, no Capitólio, em Washington, em viagem organizada pelo WBO (Washington Brazil Office).

A moção de Sanders pede que o governo americano rompa as relações com o governo brasileiro caso o presidente Jair Bolsonaro cumpra as ameaças que tem feito publicamente de não respeitar o resultado das urnas na eleição presidencial de outubro. “Seria inaceitável para os EUA reconhecer e trabalhar com um governo que, na verdade, tenha perdido as eleições. Isso seria um desastre para o povo brasileiro e mandaria uma mensagem desastrosa ao mundo todo sobre a força da democracia”, disse o senador ao site Politico.

O instrumento usado para esse fim é o que se chama nos EUA de “sense of Senate”, uma moção na qual o Senado americano expressa posição acerca de um tema relevante. Esse tipo de moção não tem força de lei, mas tem a capacidade de influenciar a tomada de decisões do governo em suas ações. Na prática, o gabinete de Sanders vai se empenhar para recolher o máximo de assinaturas possíveis em apoio à moção, que normalmente é acolhida por aclamação.

Sanders é um dos parlamentares americanos que receberam uma comitiva de representantes da sociedade civil brasileira que estiveram em Washington de 24 a 29 de julho alertando interlocutores locais para as ameaças à democracia e ao processo eleitoral no Brasil. Além dele, foram visitados, no Capitólio, os deputados Jamie Raskin (Maryland, membro da comissão que investiga o 6/1), Hank Johnson (Geórgia), Mark Takano (Califórnia) e Sheila Cherfilus McCormick (Flórida), além dos assessores dos senadores Patrick Leahy (Vermont, presidente do Senado) e Ben Cardin (Maryland).

A comitiva apresentou a seus interlocutores – que incluíram ainda o Departamento de Estado americano e organizações da sociedade civil local – dois pedidos:

  1. Que esses interlocutores americanos se informem sobre a situação no Brasil, onde o próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, coloca em questão o sistema eleitoral e o resultado das urnas, atacando a independência dos Poderes, por meio de ações dirigidas contra a Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal; e

  2. Que esses mesmos interlocutores americanos se manifestem, dentro de suas áreas de ação e de influência, reconhecendo a confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro e a validade do resultado da eleição, seja quem for o vencedor, em outubro de 2022

 Na ocasião do encontro, em 26 de julho, Sanders declarou: “O que eu ouvi [da comitiva], infelizmente, soa muito familiar para mim, por causa dos esforços de [Donald] Trump e de seus amigos para minar a democracia americana. Não estou surpreso que Bolsonaro esteja tentando fazer o mesmo no Brasil. Esperamos muito que o resultado das eleições [brasileiras] seja reconhecido e respeitado, e que a democracia prevaleça, de fato, no Brasil.”

Outro resultado concreto da visita da comitiva a Washington foi a publicação, por parte da CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) da OEA (Organização dos Estados Americanos) de um comunicado de imprensa instando o Brasil a “prevenir a violência, garantindo medidas de proteção e segurança no contexto eleitoral, bem como a realização das investigações pertinentes a esses fatos”. A nota cita fatos que foram relatados à CIDH pela comitiva brasileira, como o assassinato do petista Marcelo Aloízio de Arruda pelo militante bolsonarista José da Rocha Garanho, em Foz do Iguaçu, em 9 de julho, além de ataques com drones e bombas caseiras em atos políticos do PT.  

O documento diz ainda que “embora a Comissão Interamericana destaque a força das instituições democráticas e do Estado de Direito no Brasil, ela urge às altas autoridades do país e a todas as lideranças políticas não fazer declarações que possam promover intolerância, discriminação, desinformação deliberada ou ódio”.

 A viagem da comitiva brasileira foi organizada pelo WBO (Washington Brazil Office), em parceria com a WOLA (Washington Office On Latin America), o Atlantic Council, o CEPR (Center for Economic and Policy Research), a Amazon Watch e Action for Democracy.

O WBO é um think tank independente e apartidário que se dedica de maneira especializada a promover cooperação e conhecimento sobre a realidade brasileira e a oferecer apoio ao trabalho internacional da sociedade civil, movimentos sociais e demais setores do Brasil em Washington, em defesa da democracia, dos direitos humanos, do meio ambiente e das liberdades.

Declaração final da comitiva

“Nós, da comitiva de representantes de 19 organizações da sociedade civil brasileira, que estivemos em Washington, entre 24 e 29 de julho de 2022, para discutir nos EUA os ataques à democracia no Brasil, consideramos que a viagem atingiu o objetivo de informar alguns dos atores mais proeminentes e influentes da política americana sobre o momento delicado que a democracia brasileira atravessa.

Nos mais 20 encontros realizados ao longo destes cinco dias, fomos recebidos com deferência e ouvidos com uma genuína atenção por parte de todos os atores relevantes que procuramos encontrar. Pudemos constatar que existe hoje, nos EUA – como estamos certos de que há em outras partes do mundo também – uma atenção especial com o momento político que o Brasil atravessa.

Pudemos entender que os rumos de um país de dimensões continentais, com uma população de mais de 212 milhões de habitantes, reserva de um patrimônio ambiental  e cultural de importância global, que ocupa lugar proeminente na economia mundial, é um assunto que tem implicações que transbordam nossas fronteiras. A eleição brasileira é, sem dúvida, antes de tudo, um assunto brasileiro – e essa mensagem foi reforçada pela comitiva e corroborada pelos próprios interlocutores americanos, em Washington –; mas a solidez da democracia brasileira, o respeito aos direitos humanos e às liberdades individuais, ao Estado de direito e ao meio ambiente, aos indígenas e à população negra, são assuntos que dizem respeito à própria ideia de humanidade e, como tal, atraem legítima atenção e preocupação num mundo de relações interligadas e interdependentes. Bem informar esses interlocutores a respeito da realidade brasileira foi, portanto, uma das prioridades da comitiva.       

Do Capitólio ao Departamento de Estado, da CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) aos estúdios de televisão em Washington, passando pelas sedes das organizações sociais e sindicais locais, a comitiva encontrou sempre uma acolhida interessada e um olhar solidário em relação ao momento que o Brasil atravessa. Em todos esses encontros, a comitiva repetiu exaustivamente duas mensagens: informem-se sobre os ataques em curso contra o sistema eleitoral brasileiro e reconheçam com celeridade o resultado que sair das urnas, em outubro, seja quem for o vencedor, para reforçar a voz da comunidade internacional e, com isso, impossibilitar a concretização das ameaças golpistas que vêm sendo feitas publicamente ao longo dos últimos anos.

Em todos os momentos, encontramos uma escuta atenta e preocupada. Em vários momentos, recebemos de volta, imediatamente, manifestações públicas de respaldo à democracia brasileira, como nos casos das declarações do senador Bernie Sanders e do deputado Jamie Raskin, cujas palavras alcançaram grande repercussão pública no Brasil.

Voltamos ao Brasil com a certeza de que nossos esforços ajudaram a bem informar a comunidade internacional – neste caso específico, os EUA, cujo governo, por meio de vários de seus órgãos já vêm se posicionando publicamente em defesa da democracia no Brasil –, e acreditamos que a existência desta comitiva brasileira, diversa e unida, cumpriu um papel fundamental no desafio de preservar, proteger e aperfeiçoar a democracia brasileira.”

Organizações que compõem a comitiva, em ordem alfabética:

  • ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos)

  • APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil)

  • Artigo 19

  • Comissão Arns

  • CONAQ (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas)

  • Conectas Direitos Humanos

  • Geledés – Instituto da Mulher Negra

  • Greenpeace Brasil

  • Grupo Prerrogativas

  • Instituto Clima e Sociedade

  • Instituto Marielle Franco

  • Instituto de Referência Negra Peregum

  • Instituto Vladimir Herzog

  • Pacto pela Democracia

  • Transparência Internacional Brasil 

  • Uneafr

  • Voz das Comunidades

  • 342 Artes/342 Amazonia

  • NAVE

  • Washington Brazil Office

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