Como a Associação Nacional do Rifle e a indústria de armas bagunçaram a democracia no Brasil

Global Researchers Against Fascism (GRAF) é um grupo internacional de pesquisadores independentes especializados em humanidades e ciências sociais. O GRAF explora as conexões entre o fascismo e a indústria de armas, e seu trabalho com jornalismo investigativo em diferentes países contribuiu para dezenas de artigos sobre a relação entre armas de fogo e movimentos fascistas. Este texto foi escrito originalmente para a edição 61 do Boletim WBO, publicado em 7 de abril de 2023. Preencha o formulário ao final do texto para acessar e assinar o boletim semanal WBO em inglês.


Sob a administração do presidente Jair Bolsonaro, o Brasil se tornou uma mina de ouro para a indústria internacional de armas. O Estatuto do Desarmamento do país, de 2003, foi desmantelado por diversos decretos assinados por Bolsonaro e também por ações protagonizadas por aliados dele na Câmara dos Deputados e no Senado. O objetivo de todas essas iniciativas era facilitar o acesso civil a armas de fogo. Uma consequência é que a venda de armas disparou no Brasil nos últimos anos. À medida que a legislação de controle de armas foi alterada, a cultura de armas também foi reformulada devido a um método sofisticado de influência que mudou a percepção e o comportamento de consumo de muitos brasileiros em relação a armas de fogo.

O regime de Bolsonaro não reinventou a roda. Em vez disso, entrou em contato com a National Rifle Association (NRA) para aprender como aplicar suas estratégias de marketing, networking e lobby no Brasil. Liderado por Eduardo Bolsonaro, um dos filhos de Jair Bolsonaro, um grupo chamado Pró-Armas nasceu como a versão brasileira do NRA.

Para entender como o Pró-Armas foi criado, é importante olhar além da ideia de que o armamento civil é simplesmente parte da agenda usual da extrema-direita e além da propaganda sobre a posse de armas como um direito. A pergunta que devemos fazer é cui bono: qual segmento da economia se beneficia mais com a proliferação de armas e como esse segmento está pressionando para mudar a legislação. A mídia brasileira tem negligenciado essa questão. Tanto a mídia convencional quanto a independente chegaram a reconhecer que a família Bolsonaro formou fortes laços com a extrema-direita internacional, incluindo personagens famosos como Donald Trump, Steve Bannon e o líder húngaro Viktor Orban. Mas a imprensa ainda não examinou quem está apoiando movimentos e líderes internacionais de extrema-direita – e mais especificamente, quem está financiando a conexão entre os Bolsonaros e a extrema-direita americana. A notícia ainda não foi dada. Mas estamos aqui para dizer: a indústria internacional de armas está financiando a agenda da extrema-direita no Brasil.

Concluímos que antes das eleições de 2018 eles conspiraram criminosamente para obter apoio estrangeiro para desmantelar o Estatuto do Desarmamento em caso de eleição de Bolsonaro. Eles conspiraram contra a democracia no Brasil em conjunto com a indústria internacional de armas
— Global Researchers Against Fascism (GRAF)

Por meio de pesquisas independentes disponíveis para o jornalismo investigativo, nossa equipe utilizou nossa experiência em ciências humanas e sociais para observar as interações de mídia social dos filhos de Jair Bolsonaro – Flavio, Carlos e Eduardo – com outras pessoas ligadas à indústria de armas. Trabalhamos para conectar as trilhas digitais que eles deixaram. Concluímos que antes das eleições de 2018 eles conspiraram criminosamente para obter apoio estrangeiro para desmantelar o Estatuto do Desarmamento em caso de eleição de Bolsonaro. Eles conspiraram contra a democracia no Brasil em conjunto com a indústria internacional de armas.

Encontramos indícios de que, a partir do final de 2015, a família Bolsonaro passou a se relacionar com alguns funcionários de clubes de tiro nos Estados Unidos. Os funcionários da 88 Tactical, com sede em Omaha, Nebraska, facilitaram o networking com a NRA e com a indústria internacional de armas. Mais tarde, passou a estabelecer uma ligação estreita com a família Trump e com Steve Bannon, que trabalharam juntos para ajudar a família Bolsonaro a vencer as eleições de 2018.

Em outubro de 2018, Jair Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil. O filho mais velho dele, Flávio, foi eleito senador e Eduardo Bolsonaro foi reeleito deputado federal. Em 2020, Carlos Bolsonaro foi reeleito vereador na cidade do Rio de Janeiro.

Em junho de 2020, a Pró-Armas foi fundada oficialmente por um advogado chamado Marcos Pollon. Extraoficialmente, porém, foi fundado por Eduardo Bolsonaro com a ajuda da NRA. Com apenas dois anos de existência, o grupo conta com 50 mil membros inscritos e atua na maioria das regiões do país. Ele trabalhou diretamente com membros das legislaturas nacional e estadual para alterar a legislação de controle de armas. Também ajudou a promover e divulgar os clubes de tiro em todo o país.

Em 2022, o Pró-Armas apoiou a candidatura de senadores, governadores e parlamentares. A maioria deles pertencentes ao Partido Liberal (PL), mesmo partido de Jair Bolsonaro e de dois de seus filhos, Flávio e Eduardo. Foram eleitos 38 deles, incluindo o diretor da organização, Marcos Pollon, para a Câmara dos Deputados, e o ex-vice-presidente general Hamilton Mourão, para o Senado. A equipe do Pró-Armas, agora servidores públicos, trabalhará pelos próximos quatro anos com a missão de aniquilar o Estatuto do Desarmamento. Pró-Armas é apoiado pela indústria de armas. Glock e Springfield Armory são alguns dos fabricantes internacionais de armas que têm parceria com a Pró-Armas, como pode ser visto no site do grupo. Esta é uma prova de que a indústria internacional de armas está financiando a extrema direita no Brasil, representada pela família Bolsonaro e por seus aliados.


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