Enfrentando a epidemia de apatia para resolver a crise climática

Fiona Macklin, ativista climática, construtora de movimentos e otimista obstinada. Atualmente é Conselheira Sênior do projeto Groundswell, com Global Optimism, construindo o movimento 'Missão 2025' com uma ampla gama de parceiros. Este artigo foi escrito para a edição 136 do boletim semanal do WBO de 27 de setembro de 2024. Para assinar o boletim e recebê-lo gratuitamente, digite seu e-mail no campo abaixo.


 

O mundo está enfrentando uma das maiores ameaças dos tempos modernos: uma epidemia de apatia.

Recordes de temperatura estão sendo batidos em todas as latitudes. Casas estão sendo destruídas da Califórnia a Carriacou. Nossa natureza está entrando em colapso mais rápido do que previmos. Essa devastação não está mais restrita a terras distantes: está batendo à porta de cada um de nós. O próprio Brasil – ainda que considerando apenas os últimos meses – sofreu a pior seca já registrada e inundações contínuas no Rio Grande do Sul. À medida que essa ameaça existencial avança em nossa direção a uma velocidade vertiginosa, o que a maioria de nós faz? Nós nos sentamos e silenciosamente e passamos o dedo na tela do celular. E rolamos a tela. E rolamos.

Em 2023, mais de 70% dos artigos publicados sobre o clima nos EUA e no Reino Unido eram objetivamente fatalistas. Esse tom derrotista está alimentando uma sensação de desamparo e minando a confiança em nós mesmos enquanto promotores de mudanças positivas. Um estudo recente da Lancet destacou como 10.000 pessoas pesquisadas com idades entre 16 e 25 anos globalmente concordam que “a humanidade está condenada”. Essa crescente insensibilidade em resposta a uma narrativa de melancolia está funcionando como uma forma de protecionismo de combustíveis fósseis.

Precisamos de um drible ao estilo Cristiano Ronaldo em nossa mentalidade se quisermos enfrentar a crise climática a tempo de proteger nosso futuro e o das gerações futuras. Compromissos foram feitos. Soluções estão disponíveis. O dinheiro está no sistema. O que mais precisamos é reacender o que é sem dúvida nossa característica mais poderosa como espécie humana: nossa capacidade de imaginar e acreditar ativamente e teimosamente em um futuro melhor. Aqui estão algumas reflexões sobre como podemos começar a enfrentar essa epidemia de apatia.

Duas verdades, uma mentira

Atualmente, enfrentamos duas verdades aparentemente contraditórias que estão simultaneamente certas: por um lado, esses eventos climáticos extremos continuam a piorar mais rapidamente do que o previsto, destruindo casas e custando milhões de dólares e milhares de vidas. Por outro lado, o progresso positivo está em andamento nos principais setores da economia. Mais de dois terços das receitas anuais (US$ 31 trilhões) nas maiores empresas do mundo estão agora alinhadas com o “net zero” (equilíbrio entre a quantidade produzida de gases geradores do efeito estufa e a parcela removida desses gases da atmosfera), representando um aumento de 45% em apenas dois anos. O mundo agora investe duas vezes mais em tecnologia limpa do que em combustíveis fósseis. Investir na natureza e na alimentação já é lucrativo hoje. Desde o início do ano, pelo menos US$ 1,4 bilhão em investimentos para soluções baseadas na natureza (NbS) foram anunciados no Brasil.

A mentira? Que essa transformação não acontecerá rápido o suficiente. Essa decisão depende de nós. Mas se não ouvirmos o suficiente sobre o progresso em andamento e as oportunidades de escalar isso, não é de se admirar que permaneceremos paralisados ​​por nossa falta de esperança.

Defensores de Paris, falem!

Sabemos que as pessoas querem mudanças. 77% dos cidadãos globais querem que seus governos ajam urgentemente sobre o clima e 55 das principais empresas multinacionais do mundo com receitas anuais combinadas de mais de US$ 4,4 trilhões publicaram planos de transição em linha com a proposta de 1,5°C (proposta que busca amarrar os países no compromisso de não fazer com que o aumento das temperaturas ultrapasse 1,5°C). Além disso, 530 investidores institucionais signatários e seus representantes que administram mais de US$ 29 trilhões de AUM assinaram atualmente a Declaração Global dos Investidores pedindo desbloqueios de políticas para liberar capital privado. E, no entanto, esse apetite por mudança ainda não está sendo ouvido alto o suficiente.

Precisamos de líderes para aumentar o volume. Uma coalizão crescente de empresas, investidores, governos subnacionais, atores da sociedade civil, entre outros, sob a “Missão 2025” – incluindo Allianz, Fortescue, SAP, Unilever, IKEA, Natura & Co, ReNew e mais de 70 organizações de rede, incluindo WMBC, WBCSD, The B Team, C40, Under2 Coalition, HealthCare Without Harm – estão se manifestando para colaborar com os governos na ampliação dos próximos planos climáticos nacionais (conhecidos como Contribuições Nacionalmente Determinadas) em linha com o Acordo de Paris.

Descritos como “Defensores de Paris”, esses Parceiros da Missão 2025 apareceram com força em Nova York na semana passada, onde líderes mundiais e empresas globais se reuniram para a Assembleia Geral da ONU e para a Semana do Clima de Nova York – um momento de destaque no calendário climático. Eles deixaram claro que estão prontos para ajudar a moldar o desenvolvimento e apoiar a entrega dessas Contribuições Nacionalmente Determinadas, porque esses planos fornecerão a certeza política necessária para liberar o investimento. Dados da Comissão de Transições Energéticas revelam como a implementação de um pequeno número de medidas políticas positivas de investimento poderia escalar o investimento para US$ 1 trilhão dos US$ 3,5 trilhões por ano, que são necessários para a transição do setor de energia em linha com a meta de 1,5°C.

Vamos parar de apenas rolar a telinha desses aparelhos e ver desgraça. Vamos retomar o controle. Afaste-se da nossa obsessão pelo smartphone e desperte novamente nossa imaginação. Liberte-se da nossa indiferença e fale com confiança.

Precisamos de uma mentalidade de Carnaval para a ação climática

Se há algum lugar que é maravilhosamente vazio de apatia, é o Carnaval no Brasil. Podemos e devemos trazer essa efervescência brasileira e essa energia coletiva para o coração do movimento climático global – por meio da COP29, das NDCs 3.0 (as contribuições nacionais anuais) e em direção à COP30. Podemos e devemos acreditar em um futuro melhor para o nosso planeta e para nós mesmos. A apatia em relação às mudanças climáticas é um privilégio que não podemos pagar.

Entre em contato se quiser fazer parte da Missão 2025.   


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