A retrospectiva de 2024 pela Aliança Brazil Office
Comunicado institucional
8 de janeiro de 2025
O ano de 2024 teve como marco institucional a criação da Aliança Brazil Office/Brazil Office Alliance e o lançamento do Europa Brazil Office (Bruxelas e Genebra) e da Associação Brasil Office (Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília), que passam a trabalhar de forma integrada e coordenada com o Washington Brazil Office (Estados Unidos).
A formação de uma Aliança composta pelas três organizações dará a partir de 2025 melhor estrutura e maior alcance ao trabalho internacional das 73 organizações da sociedade civil e dos movimentos sociais filiadas, para que elas possam ampliar o escopo e a efetividade de suas ações no Brasil, na Europa e nos Estado Unidos.
O contexto em que se deu
o trabalho da Aliança em 2024
O ano de 2024 foi marcado, no Brasil, pela elucidação da trama golpista protagonizada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, seus ministros e outros membros da alta cúpula das Forças Armadas, que, de acordo com inquérito da Polícia Federal, planejaram a execução de adversários políticos, o impedimento da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a implementação de uma nova ditadura militar no país, nos moldes do regime que vigorou entre 1964 e 1985.
A vitória eleitoral de Donald Trump, nos EUA, energizou os setores golpistas de extrema direita no Brasil, que passaram a usar de maneira mais recorrente seus contatos internacionais. Essa articulação teve como alvo o Congresso americano e o Sistema Interamericano de Direitos Humanos. O argumento foi o de que existe no Brasil uma perseguição política que viola a liberdade de expressão.
O WBO já vinha alertando interlocutores estrangeiros sobre o risco de um golpe da extrema direita no Brasil. Esse alerta foi dado inicialmente com a organização da comitiva de líderes da sociedade civil que, em julho de 2022, esteve em Washington para informar membros do Departamento de Estado americano, parlamentares, sindicalistas, jornalistas, ativistas e acadêmicos sobre a estratégia de Bolsonaro para contestar de maneira irregular a vitória de Lula. As informações repassadas pelo WBO se comprovaram verdadeiras com a publicação do inquérito da Polícia Federal no final de 2024.
O ano foi marcado não apenas pela luta em defesa da democracia, mas também pelo enorme esforço de preservação ambiental e de defesa dos povos indígenas. A Aliança Brazil Office redobrou os esforços nesse setor, chamando a atenção de maneira especial para os riscos que pairam sobre o cerrado, a enorme savana brasileira. O WBO também articulou no Congresso americano o debate sobre a adoção de leis mais restritivas para o comércio de produtos minerais extraídos de áreas de preservação no Brasil.
As agendas ligadas às questões raciais e de gênero permaneceram no topo das prioridades institucionais da Aliança Brazil Office. Ambas agendas ganharam impulso renovado no Brasil, em 2024, na esteira da consolidação da agenda mais ampla de direitos humanos do governo Lula, depois de quatro de pesados ataques ao setor, por parte da Jair Bolsonaro.
58
Era o número de organizações
filiadas ao WBO em 2023
73
É o número de organizações
filiadas à Aliança em 2024
Interação governamental
Ao longo de 2024, a Aliança Brazil Office engajou-se em aproximações estratégicas e diálogos construtivos nas mais altas esferas do poder público, para aumentar o alcance e para promover as agendas cruciais da sociedade civil. Os esforços para proteger a democracia, os direitos humanos e o meio ambiente se deram não apenas no âmbito nacional, mas também junto ao Congresso americano e às instâncias europeias de governança do bloco.
Em Brasília, representantes da organização aprofundaram os contatos com interlocutores chaves dos partidos políticos e das bancadas de interesse para a sociedade civil. Mais de 40 deputados e 8 senadores mantiveram encontros com o Brazil Office ao longo do ano. Os esforços também foram dirigidos à interlocução com as representações diplomáticas estrangeiras presentes na capital brasileira.
Defesa da democracia
Num ano marcado pelo constante assédio da extrema direita e pela consequente resposta da Justiça aos ataques à democracia, o Brazil Office focou seus esforços em combater o autoritarismo populista e em fortalecer as redes nacionais e internacionais de colaboração, como no caso da adesão à Global Democracy Coalition – uma rede internacional composta por diversas organizações da sociedade civil, fundações e instituições acadêmicas dedicadas à promoção e fortalecimento da democracia em nível global.
A formação de uma rede de pesquisadores que trabalham de maneira articulada no monitoramento e na reação aos ataques à democracia permitiu que a organização intercedesse de maneira rápida e eficiente para confrontar as falsas narrativas promovidas pela extrema direita bolsonarista nos EUA. Representantes do WBO conseguiram impedir que esses setores extremistas realizassem uma sessão na Comissão Tom Lantos de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Em maio de 2024, esse setor político extremista conseguiu realizar uma sessão no Subcomitê de Saúde Global, Direitos Humanos Globais e Organizações Internacionais do Comitê de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados dos EUA, e o WBO reagiu prontamente, garantindo que um de seus pesquisadores associados, Fábio Sá e Silva, fosse ouvido na sessão e, assim, confrontasse a falsa narrativa segundo a qual as ações do Judiciário brasileiro constituem ameaças à liberdade de expressão.
Ainda em Washington, o WBO solicitou a realização de uma audiência na CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) sobre direitos humanos, liberdade de expressão e a regulação das redes sociais. A proposta foi aceita, mas a CIDH decidiu que, na mesma audiência, ouviria membros da extrema direita bolsonarista que tentam convencer interlocutores internacionais de que são um setor perseguido. As organizações da sociedade civil se recusaram a participar de uma audiência que misturaria questões legítimas com falsas narrativas.
A organização trabalhou para fornecer informações acuradas, fidedignas e confiáveis sobre o que acontece no Brasil, de maneira a contrapor a narrativa da extrema direita brasileira. As articulações internacionais incluíram contatos com a Relatoria para Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana e a Relatoria Especial das Nações Unidas para os Direitos de Assembleia e Associação Pacíficas.
Em Genebra, a organização copatrocinou o evento paralelo à sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU chamado “Movimentos de extrema direita e suas implicações nos direitos humanos”.
Meio ambiente e
povos indígenas
Ao longo de todo o ano de 2024, o Brazil Office realizou ações robustas dirigidas ao cumprimento das promessas de aporte financeiro para a preservação ambiental. Em abril, o WBO manteve contato com o colíder do Brazil Caucus no Congresso dos EUA advogando pela inclusão de um pedido de liberação de recursos para o Fundo Amazônia nas comunicações que seriam feitas pelo Congresso dos EUA ao presidente Joe Biden em relação ao orçamento nacional de 2024.
Na Europa, a organização acompanhou líderes da sociedade civil brasileira ao Parlamento da UE para abordar as deficiências do Regulamento de Desmatamento da UE (EUDR) e do Acordo UE-Mercosul. No Brasil, foram organizados três painéis sobre justiça climática e direitos humanos em Manaus, durante a 167ª Sessão da Corte Interamericana.
A organização também participou de uma reunião do Grupo de Trabalho Conjunto em Brasília, que analisou a implementação de medidas cautelares ordenadas pela CIDH após os assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips, bem como ameaças feitas contra 11 membros da Unijava (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari). Essas medidas foram uma resposta a uma solicitação apresentada à CIDH pela WBO e seis organizações parceiras.
Em dezembro, o WBO, em colaboração com a Plataforma CIPÓ e outros parceiros importantes, organizou uma delegação parlamentar para Washington, focada em promover a ação climática, o desenvolvimento sustentável e os valores democráticos. As discussões abordaram desafios compartilhados, incluindo a ascensão de movimentos de extrema direita, ameaças à democracia e estratégias para garantir uma participação robusta nas próximas negociações climáticas, particularmente a COP30.
Desde julho, a WBO apoia a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) no fortalecimento de seus esforços de advocacia internacional. Este apoio inclui discussões sobre possíveis rotas de advocacia dentro de sistemas globais e regionais e a elaboração de uma proposta para uma audiência pública durante a 191ª sessão da CIDH.
Ao longo do ano, a organização trabalhou em mais de sete propostas de projetos focadas em comunidades tradicionais e transições energéticas do Brasil. Esses projetos visam avaliar riscos e facilitar o diálogo entre organizações da sociedade civil, sindicatos, governos e o setor privado. As propostas foram apresentadas a várias instituições filantrópicas e ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A WBO também envolveu várias partes interessadas no escritório do Alto Comissariado da ONU em Genebra, discutindo as questões de demarcação de terras do Brasil em relação a novos modelos de desenvolvimento sustentável. Além disso, representantes da WBO participaram e lideraram discussões em grandes universidades, incluindo a Georgetown University, a George Washington University, a Brown University e a Yale University.
Em Nova York, o WBO organizou um evento sobre Justiça Climática em colaboração com o Columbia University Global Center Rio de Janeiro, Instituto Decodifica, Centro Brasileiro de Justiça Climática, WRI Brasil e Fundação Getúlio Vargas. O evento, intitulado "Nova Meta Climática do Brasil: Desafios e Perspectivas para a Justiça Climática", teve como objetivo abordar como diferentes grupos são desproporcionalmente afetados pelas mudanças climáticas e como as novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) do Brasil incorporam a justiça climática em caminhos de mitigação de emissões.
Desde agosto, a WBO oferece apoio estratégico a organizações que fornecem assistência jurídica a indivíduos e comunidades deslocadas de Macacos, um distrito próximo a Belo Horizonte em risco de rompimento de barragem. Essas comunidades enfrentam assédio legal da Vale e do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. A assistência da WBO inclui comunicação estratégica e advocacia para aumentar a conscientização sobre sua situação.
A organização também esteve envolvida na organização de uma visita da Redesca (Relatora Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais) da CIDH ao Rio Grande do Sul para avaliar os impactos dos direitos humanos das enchentes de abril de 2024.
Em Genebra, o Brazil Office coorganizou o evento paralelo "Direitos Territoriais dos Povos Indígenas - O Marco Temporal e os Direitos Indígenas no Brasil", com a participação do Relator Especial da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Esta iniciativa fez parte de uma estratégia de litígio de longo prazo perante um comitê de direitos humanos da ONU.
Questão racial
e mulheres
O WBO desempenhou um papel fundamental no apoio a três organizações afiliadas — CEERT, Agbara Fund e Redes da Maré — durante a 68ª Sessão da Comissão sobre o Status da Mulher (CSW68) em Nova York, o maior encontro anual da ONU sobre gênero. As organizações participantes enfatizaram a interseccionalidade de gênero e antirracismo, chamando a atenção para os desafios específicos enfrentados pelas mulheres negras brasileiras.
A organização também se envolveu em advocacia política para apoiar a aprovação de um projeto de lei para renovar as cotas raciais para cargos públicos no Brasil, colaborando com uma coalizão de movimentos negros, autoridades governamentais e organizações de direitos humanos, na defesa da aprovação de um projeto de lei referente ao tema.
Em abril, a organização apoiou sete organizações do movimento negro durante a Terceira Sessão do Fórum Permanente sobre Pessoas de Ascendência Africana, realizada em Genebra. Um resultado significativo desse engajamento foi a elaboração de um "Manifesto Conjunto sobre a Posição da República Portuguesa nos Debates do Terceiro Fórum Permanente das Nações Unidas para Pessoas de Ascendência Africana". Este manifesto, assinado pelas sete organizações, expressou profunda preocupação com a ausência de medidas reparadoras concretas pelo governo português em relação às injustiças históricas da escravidão e da colonização.
Em 2024, o Brazil Office forneceu suporte direcionado para preparar submissões para a "Chamada para submissões escritas sobre Princípios, Disposições e Caminhos para a Justiça Reparadora para Africanos e Pessoas de Descendência Africana" emitida para a 35ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.
A organização também apoiou suas afiliadas e parceiras no processo de verificação de compromissos que foram assumidos pelo Estado brasileiro em relação ao combate a todas as formas de discriminação contra as mulheres. Esses compromissos derivam da adesão do Brasil à Cedaw (Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, na sigla em inglês), aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 1979 após uma intensa campanha global liderada por movimentos de mulheres e direitos humanos.