Partido de Bolsonaro amplia ofensiva golpista. Justiça reage

Press Release WBO 25 de novembro de 2022

Valdemar Costa Neto, à esquerda, durante apresentação do relatório do PL (Partido Liberal) que contesta o resultado da eleição de 2022, em conferência de imprensa, em Brasília, no dia 21 de novembro de 2022. Crédito: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

  • Legenda do presidente vai à Justiça Eleitoral questionar a vitória legítima de Lula

  • Ministro Alexandre de Moraes nega pedido para invalidar quase metade das urnas   

A coligação de partidos pelos quais Jair Bolsonaro concorreu à reeleição – formada pelo Republicanos, pelo PP (Partido Progressista) e pelo PL (Partido Liberal), este último, partido do presidente – pediu nesta terça-feira (22) que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) invalide o resultado do segundo turno da disputa de outubro. Em resposta, o presidente da corte eleitoral, o ministro Alexandre de Moraes, reagiu negando a petição e multando as três legendas em R$ 22,9 milhões (US$ 5,3 milhões no câmbio de 24 de novembro) por “litigância de má fé”. 

A ofensiva da coligação é mais um capítulo da insistente busca dos seguidores do atual presidente, Jair Bolsonaro, por desacreditar o sistema eleitoral e atacar a democracia no Brasil. A resposta de Moraes, por sua vez, renova o embate frontal que o ministro tem protagonizado com esse setor político.

A coligação busca contestar a eleição presidencial de outubro, que foi vencida por Luiz Inácio Lula da Silva, do PT (Partido dos Trabalhadores), argumentando que 279,3 mil das 577 mil urnas eletrônicas apresentaram “mau funcionamento”. O advogado do partido, Marcelo Bessa, diz que é impossível “atestar que as urnas registraram o resultado eleitoral segundo a vontade dos eleitores”. Por essa razão, segundo ele e outros membros do partido, a disputa deveria ser anulada

O documento apresentado pelos partidos bolsonaistas à Justiça Eleitoral não traz, no entanto, nenhuma evidência que comprove as alegações. O texto repete, numa pretensa linguagem técnica e formal, as mesmas acusações infundadas que vinham sendo repetidas há meses por Bolsonaro e por seus apoiadores contra o sistema eleitoral brasileiro desde antes das eleições, quando as pesquisas de opinião já projetavam a vitória de Lula, confirmada nas urnas. 

A nova ofensiva encontrou resistência do Judiciário. Dois dias depois de receber o pedido, Alexandre de Moraes, impôs multa milionária ao partido do presidente brasileiro por entender que a petição tem no fundo a finalidade de “tumultuar o próprio regime democrático brasileiro”.

“A ação em si é mais do mesmo. O documento apresentado pelo PL e demais partidos bolsonaristas faz parte de um conjunto de ações empreendidas pelos seguidores de Bolsonaro há meses para sabotar a democracia no Brasil. Já é sabido que se trata de uma campanha bem organizada politicamente, que vem sendo respaldada por políticos e financiada por empresários interessados em dificultar ao máximo a transição e um novo mandato de Lula”

Paulo Abrão, diretor-executivo do WBO

“Em muitos sentidos, esse setor político de extrema direita no Brasil vem seguindo um roteiro semelhante ao do ex-presidente dos EUA, Donald Trump, que consiste em usar as redes sociais para disseminar notícias falsas com as quais buscam desacreditar o sistema eleitoral e subverter a ordem democrática, insuflando uma militância radicalizada e por vezes violenta

James N. Green, presidente do Conselho Diretivo do WBO.  

GOLPISMO ANTES DA POSSE DE LULA

Bolsonaro ainda tem um mês de mandato até a posse de Lula, marcada para 1º de janeiro de 2023. Até lá, o atual presidente brasileiro continua sendo uma ameaça à democracia, pela forma como manipula uma base de apoiadores radicalizados e pela influência nociva que busca manter sobre policiais militares e membros das Forças Armadas.

A expressão mais visível dessa instabilidade é a continuidade dos protestos de eleitores de presidentes que, desde a eleição, estão acampados na frente de instalações militares, pedindo que as Forças Armadas tomem o poder. O presidente do Brasil vem dando declarações ambíguas a respeito desses manifestantes, sem nunca desencorajá-los de maneira clara.

Em diversos pontos do país, permanecem os bloqueios de rodovias protagonizados por apoiadores do presidente derrotado. Esses bloqueios preocupam a equipe de transição do presidente Lula, cujos membros se reuniram com Moraes e com comandantes das Polícias Militares dos Estados, que são as responsáveis por lidar com os bloqueios.

O movimento golpista vem assumindo posições cada vez mais radicalizadas, embora localizadas. Em Rondônia, o Ministério Público estadual apura um ataque a uma instalação de fornecimento de água, que pode vir a ser enquadrada como ato de terrorismo. Em alguns estados, até a Polícia Rodoviária Federal vem sendo atacada por manifestantes.     

Além disso, os comandantes das três Forças – Exército, Marinha e Aeronáutica – publicaram nota no dia 11 de novembro uma nota oficial na qual citam as “manifestações populares que vêm ocorrendo em inúmeros locais do país” e dizem reafirmar seu “compromisso irrestrito e inabalável com o povo brasileiro”.

Na mesma linha, o vice-presidente Hamilton Mourão, ele mesmo um general da reserva do Exército Brasileiro, eleito senador em outubro, disse ver nas manifestações golpistas uma “catarse coletiva”. Assim como Bolsonaro – que desde a derrota para Lula raramente é visto em público –, Mourão também se recusa a desencorajar os golpistas.

“A ameaça de um golpe de Estado permanece viva no Brasil. Infelizmente, é preciso dizer isso de maneira clara: Bolsonaro perdeu a eleição, mas ele e os aliados dele nunca deixaram de jogar esse jogo ambíguo, no qual evitam a todo custo respeitar as regras e as instituições. Há uma tensão latente, que não se dissipa completamente”, disse Abrão.

O WBO empreendeu esforços para que organizações da sociedade civil brasileira dessem a conhecer, nos EUA, a atual situação de ameaça à democracia, ao meio ambiente e aos direitos humanos no Brasil. Como parte desse esforço, representantes de 19 organizações brasileiras estiveram em Washington em julho, em encontros com congressistas, com o Departamento de Estado e com organizações da sociedade civil local. 

Desde então, deputados e senadores americanos que receberam essa comitiva fizeram pelo menos três pedidos formais ao presidente Joe Biden para que ele usasse suas prerrogativas sobre a política externa americana para indicar a Bolsonaro que os EUA não aceitariam em hipótese alguma relacionar-se com um governo golpista. Além disso, o Senado americano aprovou por unanimidade uma moção neste sentido.

“A defesa da democracia brasileira não importa apenas para o Brasil. Um país com essas dimensões, com esse peso e com essa importância está inevitavelmente interligado com os demais. É nesse sentido que os atores internacionais agem: para mostrar que prezam pela democracia brasileira e que estão vigilantes a esse respeito, em solidariedade e em apoio aos que lutam para preservar a democracia dentro do Brasil”, disse Green.

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